Por Kleber Karpov
Em uma sessão marcada por acusações e negações, a presidiária, deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), presa na Itália para onde fugiu antes de condenação pelo Supremo Tribunal Federal (STF), confrontou virtualmente o hacker Walter Delgatti Neto, na quarta-feira (10/Set), em audiência da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados. O colegiado analisa o processo de cassação do mandato da parlamentar, pós-condenação do STF, a dez anos de prisão por ser a mandante da invasão do sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
O depoimento de Delgatti, que também participou da sessão por meio de videoconferência de uma prisão em São Paulo, foi o ponto central da reunião. O hacker reafirmou que Zambelli o contratou para invadir o sistema do CNJ com o objetivo de desacreditar a segurança do Poder Judiciário e, consequentemente, do sistema eleitoral brasileiro.
“Ela [Zambelli] me disse assim: – ‘Se você for pego ou processado, pode falar que quem mandou fui eu. Você pode falar, que eu assumo isso’”, declarou o hacker. Segundo Delgatti, a parlamentar também solicitou a inserção de um mandado de prisão falso contra o ministro do STF Alexandre de Moraes.
Zambelli, por sua vez, negou veementemente as acusações e classificou Delgatti como um “mitomaníaco” com compulsão por mentir. “O senhor me fez corresponsável. Eu respondo por 16 mandados: um mandado de prisão do Alexandre de Moraes e por mais 15 mandados de soltura de criminosos do PCC, do Comando Vermelho, de traficantes de drogas, de assassinos e de estupradores. É por isso que fui condenada a dez anos de prisão”, afirmou a deputada.
Sistema eleitoral

Durante a sessão na Câmara Delgatti afirmou conhecer Carla Zambelli desde 2022, ocasiçao em que a deputada o contratou com intuito de comprovar que o sistema do CNJ era violável e, consequentemente, no entender da parlamentar, desacreditar a segurança do sistema de justiça e eleitoral no Brasil.
“Ela [Zambelli] me disse assim: ‘Se você for pego ou processado, pode falar que quem mandou fui eu. Você pode falar, que eu assumo isso’”, declarou Delgatti. “Assim que eu consegui invadir o CNJ, ela pediu que eu fizesse um despacho e uma ordem de prisão do ministro Alexandre de Moraes.”, disse Delgatti ao afirmar ter recebido suporte financeiro e promessa de emprego.
Carla Zambelli por sua vez, disse que Delgatti é mitomaníaco, com compulsão por mentir e que alterou a versão dos fatos diversas vezes. A parlamentar reclamou, por exemplo, da condenação em razão de mandados de soltura de membros de organizações criminosas, inseridos no sistema pelo hacker. A inserção, segundo Delgatti, teria sido feita por um robô.
“O senhor me fez corresponsável. Eu respondo por 16 mandados: um mandado de prisão do Alexandre de Moraes e por mais 15 mandados de soltura de criminosos do PCC, do Comando Vermelho, de traficantes de drogas, de assassinos e de estupradores. É por isso que fui condenada a dez anos de prisão”, reclamou Zambelli.
Defesa na CCJ
Durante a audiência na CCJ, a defesa de Zambelli e aliados buscaram desacreditar o depoimento de Delgatti, sob apontamento de supostas contradições nas declarações do hacker. O assistente técnico da defesa, Michel Spiero, afirmou que não foram encontrados nos dispositivos da deputada nenhum texto ou mensagem que comprovasse a autoria intelectual da ordem de prisão contra o ministro Alexandre de Moraes.
O líder do PL, deputado Sóstenes Cavalcante (RJ), defendeu a correligionária, afirmando que “uma mulher não pode ser cassada por uma pessoa desqualificada que se contradiz em tudo o que fala”. Ele prometeu lutar pela manutenção do mandato de Zambelli.
Por outro lado, a deputada Fernanda Melchionna (Psol-RS) criticou a condução da sessão, classificando-a como uma “tentativa de abuso de prerrogativa de Carla Zambelli para buscar a impunidade” e uma “lavação de roupa suja” para justificar a não cassação.
Julgamento da condenação do STF?
Estranhamente, mesmo com a decisão transitado em julgado, pelo STF e com Zambelli presa na Itália após fuga do Brasil, apoiadores da parlamentar atuam para tentar imputar ao hacker a responsabilidade por crime amplamente investigado pela Policia Federal, como forma de librar a parlamentar da cassação do mandato.
Importante ressalvar que a investigação da Polícia Federal (PF), no âmbito da Operação 3FA, foi o pilar que sustentou a denúncia contra a parlamentar. Longe de se basear apenas nas palavras de Delgatti, os investigadores reuniram um conjunto de provas materiais que, segundo a acusação, corroboram a versão do hacker. Acervo esse que passou pelo crivo da Procuradoria-Geral da República (PGR), e dos magistrados da Primeira Turma do STF, responsáveis por julgar a Ação Penal (AP) 2428.
Vale lembrar que dentre as provas, a apuração confirmou transferências financeiras que totalizaram R$ 13,5 mil, realizadas por um assessor de Zambelli para a esposa de Delgatti. Para a defesa da parlamentar presidiária, meros pagamentos a serviços de manutenção e melhorias do site oficial da deputada, e não à atividades ilícitas.
Além de rastreamento, pela PF, de deslocamentos de ambos e confirmação de encontros entre Zambelli e Delgatti, inclusive um desses, nas proximidades de um hotel onde o hacker estava hospedado em Brasília, dias antes da inserção do falso mandado de prisão no sistema do CNJ, em 4 de janeiro de 2023.
Acervo de provas apresentados pela PGR, consideradas contundentes por parte de ministros do STF por demonstrar, sem margem para dúvida razoável, a autoria intelectual e o financiamento dos crimes por parte de Carla Zambelli. Os ministros destacaram a gravidade dos atos, que atentaram contra as instituições democráticas e o Estado de Direito. A condenação, portanto, não se baseou apenas no testemunho do hacker, mas em um conjunto coeso de provas materiais e circunstanciais.
O caminho de Zambelli até a prisão
A condenação de Carla Zambelli pelo STF, por unânime, incluiu a perda do mandato parlamentar. A decisão transitou em julgado, o que significa que não cabem mais recursos. Pouco antes da conclusão do julgamento, a deputada deixou o Brasil e, após passar pela Argentina e Estados Unidos, chegou à Itália, país do qual também possui cidadania.
Considerada foragida pela Justiça brasileira, Carla Zambelli foi incluída na lista de procurados da Interpol. A parlamentar acabou por ser localizada em Roma e acabou por ser denunciada às autoridades italianas pelo deputado local Angelo Bonelli. Presa em julho, a deputada aguarda o processo decisão do judiciário italiano sobre eventual extradição para o Brasil, uma vez que a presidiária mantém dupla cidadania.
Próximos passos
Em tramitação na CCJ, posteriormente, o processo de Carla Zambelli , deve ser analisado pelo Plenário da Câmara dos Deputados que deve, ou não, endossar a cassação do mandato determinado pelo STF. A expectativa é que o relatório seja votado na comissão em novembro. Enquanto isso, a deputada federal, presidiária, acompanha o desenrolar do processo que definirá seu futuro político de uma prisão na Itália.
Kleber Karpov, Fenaj: 10379-DF – IFJ: BR17894
Mestrando em Comunicação Política (Universidade Católica Portuguesa/Lisboa, Portugal); Pós-Graduando em MBA Executivo em Neuromarketing (Unyleya); Pós-Graduado em Auditoria e Gestão de Serviços de Saúde (Unicesp); Extensão em Ciências Políticas por Veduca/ Universidade de São Paulo (USP);Ex-secretário Municipal de Comunicação de Santo Antônio do Descoberto(GO); Foi assessor de imprensa no Senado Federal, Câmara Federal e na Câmara Legislativa do Distrito Federal.










