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Brasília
29 abr 2024 00:02


Ao criticar Brasília, Rui Costa se iguala a Kataguiri ou prefeitos que vêm à capital do país em busca, além de dinheiro, de turismo sexual

Por Kleber Karpov

O ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa (PT-BA) proferiu, na sexta-feira (02/Jun), uma série de comentários críticos a Brasília, durante um evento em Itaberaba (BA). Comentários esses que resultaram na reação de diversos entes políticos, inclusive vindos do próprio Partido dos Trabalhadores. Ao chamar o “Brasília”, de “ilha da fantasia”, Costa aponta desconhecer o centro político do país e desrespeita os quase 3 milhões de habitantes que nasceram, ou escolheram o DF para viver.

“Eu chamo aquilo de ilha da fantasia. Aquele negócio de colocar a capital longe da vida das pessoas, na minha opinião, fez muito mal ao Brasil”, disse antes de emendar que. “era melhor [a capital do país] ter ficado no Rio de Janeiro, ou ter ido para São Paulo, para Minas ou Bahia, para que quem fosse entrar num prédio daquele, ou na Câmara dos Deputados ou Senado, passasse, antes de chegar no seu local de trabalho, numa favela, embaixo de viaduto, com gente pedindo comida, vendo gente desempregada”, declarou o ministro.”, discursou.

Reações

Dentre as vozes que se levantaram contra as menções de Costa, está a do governador do DF, Ibaneis Rocha (MDB), que associou ao comentário, a mecanismos previsto no novo arcabouço fiscal, em tramitação no Congresso, que podem travar os reajustes do Fundo Constitucional do DF (FCDF). “Ele é um idiota completo. Não merecia estar onde se encontra. Agora já sabemos de onde vem o ataque contra o Fundo Constitucional”, afirmou o governador à coluna Grande Angular.
Por meio das redes sociais, Ibaneis, apontam que a fala de Costa, aumenta a animosidade entre as pessoas e que o país “pede paz”, para que se possam trabalhar em benefício de todos.

Mais moderada, a vice-governadora do DF, Celina Leão (Progressista), classificou tal fala de “equivocada”, a julgar que Costa mora e exerce funções ministeriais no DF. “O sonho de JK de trazer a capital para Brasília está atrelado ao desenvolvimento do interior do país – e isso realmente aconteceu! A nossa cidade tem mais de 3 milhões de habitantes. Agregada à Ride, o cálculo passa de 5 milhões de pessoas que vivem e trabalham no DF, maior que alguns estados de Federação. Acreditamos na sensibilidade do governo, mesmo com opiniões internas divergentes de não apoiar essa situação”, disse Celina.


O presidente da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF), Wellington Luiz (MDB-DF) classificou a fala de Costa de “fala xenofóbica e preconceituosa”, além de questionar se o ministro da Casa Civil, conhece a realidade da população do DF.

“É lamentável que alguém que ocupa uma posição tão importante não conheça a capital de todos os brasileiros e a chame de ‘ilha da fantasia’. Talvez, ministro, seja ‘ilha da fantasia’ para o senhor, que só conhece os hotéis de luxo e os restaurantes caros. Não conhece a realidade desse povo trabalhador, como da sua maravilhosa Bahia. É uma pena mesmo, e tenho certeza absoluta que o presidente Lula e a maioria dos seus ministros não comungam do seu pensamento, portanto convido o senhor para conhecer a periferia do Distrito Federal”, disse o deputado distrital.

Mais que isso, Luiz resgatou uma informação extremamente importante, que o episódio dos ataques golpistas, do 8 de janeiro, que levou as forças de segurança do DF a sofrerem intervenção por parte do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), foi atacado, majoritariamente, por pessoas de outros estados brasileiros.
“Uma coisa importante que o senhor saiba também. O lamentável 8 de janeiro desse ano, dos quase 1.400 detentos, menos de 100 são do Distrito Federal.”, ponderou.

Dentre outras manifestações, chamou atenção ao do deputado distrital, Chico Vigilante (PT). Enfático em afirmar que a houve uma colocação “infeliz”, por parte de Costa, o parlamentar convidou o ministro da Casa Civil a conhecer, por exemplo, Sol Nascente, “para que se conheça o verdadeiro DF”.

“A fala do ministro Rui Costa, em um evento na Bahia, de que Brasília é uma ilha da fantasia, mostra um completo desconhecimento da capital federal. Diante disto, o convido para conhecer o Sol Nascente, a Estrutural, o Pôr do Sol, e outros, para que conheça o verdadeiro DF”, disse ao chamar atenção do ministro do desenvolvimento de diversos estados brasileiros, justamente em decorrência da interiorização da capital do país.

Respeito

Também um protesto do ex-governador do DF, Rogério Rosso (PSD), que ressaltou a importância de países valorizarem e enaltecerem as respectivas capitais.

Ex-governador do DF, Rogério Rosso (PSD) – Foto: Alex Ferreira – Agência Câmara

“É triste constatar que nem toda classe política entende que, além da capital dos seus estados de origem, Brasília é a capital deles também e todos deveriam ter orgulho disso e defender Brasília como historicamente os franceses defendem Paris, os italianos Roma, os americanos Washington, o Reino Unido Londres, a China Pequim e assim por diante em todo o mundo civilizado”, disse Rogério Rosso.

Kataguiri II?

A fala de Costa, remonta a um caso recente em que o deputado federal, Kim Kataguiri (União/SP), também se utilizou do termo ‘ilha da fantasia’, durante a apreciação de um Projeto de Lei que criava 484 cargos comissionados no Tribunal de Justiça do DF e Territórios (TJDFT). “É mais uma justificativa para sugar dinheiro dos outros estados e trazer para essa ilha de fantasia que é o Distrito Federal, que consegue ter a maior renda per capta do país, não porque produz, mas sim, porque suga de outros estados.”
Fala essa, prontamente refutada pelo deputado federal, Gilvan Máximo (Republicanos-DF). “Nós temos m Brasília, empresários e pessoas honradas que vieram para cá [Brasília] e construíram uma história. Nós temos empresários que vieram no início da capital para cá.”, pontuou.

Ilha da Fantasia?

Conforme ponderou Celina Leão, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com base nos dados do Censo Demográfico 2022, coletados até 25/12/2022, o Distrito Federal conta com 2,92 mi de habitantes, consequentemente, ocupa a 21ª posição, a considerar estados da federação com maior densidade populacional do país. No contexto, em número de habitantes, o DF supera os estados do Mato Grosso do Sul (MS) com 2,83 mi, Sergipe (2,21mi), Rondônia (1,16mi), Tocantins (1,58mi), Acre (0,83mi), Amapá (0,77mi) e Roraima (0,63 mi).

Obviamente, o DF esteja longe de ser referência na indústria e no comercio, se comparado a grandes estados brasileiros, até porque não foi planejado para tais atividades, como bem o lembrou Máximo, o DF, conta com um setor produtivo forte. Com verdadeiras referências produção e exportação de tecnologias de ponta, na indústria, no comércio, na tecnologia e em outros segmentos.

Um bom exemplo, é a Indústria Rossi, empresa pioneira na fabricação de portões automáticos, que começou com uma fábrica na antiga cidade satélite de Taguatinga, atual Região Administrativa (RA) Taguatinga, hoje empresa de capital aberto, líder de mercado no Brasil e América do Sul. Ou ainda, o empreendimento mencionado por Vigilante, que exporta para o exterior, produtos produzidos na Região Administrativa Ceilândia.

Não por outro motivo, a economia do DF apresentou, em 2022, um crescimento de 4%, em comparação ao ano anterior, número esse, acima da média do índice nacional, de 2,9%. E, chama atenção que tal percentual foi possível, impulsionados por setores como a indústria (10,3%), Serviços (3,8%) e agropecuária (1,3%), de acordo com dados do Instituto de Pesquisa e Estatística do Distrito Federal (IPEDF),apresentados no início de abril desse ano.

Aliás, conforme demonstrou o Boletim de Empreendedorismo do DF da Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan)(Veja Aqui), divulgado em outubro de 2019, o ‘funcionalismo público’, que muitos tentam marginalizar, representam no DF, apenas 21,4% da força de trabalho e, fica atrás de assalariados da iniciativa privada com 42,2% e de empreendedores com 21,7%.

Se por um lado, o DF tem a vitalidade, seja pela densidade populacional acima de alguns estados brasileiros, seja por demonstrar que embora seja planejada para servir de mera cidade administrativa para as demandas políticas do país, por outro, fica claro que a capital do país apresenta problemas tão diversos quanto quaisquer uma das grandes metrópoles do país.

Sob esse contexto, embora Costa, aparentemente desconheça a existência de pessoas a pedir comida nas ruas, ou da existência de favela no quadrado, retangular do DF, talvez por ficar acondicionado em hotéis de luxo, entre o percurso do trabalho, no Palácio do Planalto, fato é que, basta uma breve parada, há aproximadamente dois ou três quilômetros que o ministro certamente vai se deparar com pessoas, com condição de vulnerabilidade social, nas proximidades da Rodoviária do Plano Piloto. Ou, se não quiser se dar ao trabalho, uma lida no caderno de cidades de qualquer veículo de imprensa deve mostrar o mesmo.

Em um percurso um pouco mais longo, de uns 40 a 45 quilômetros, o nobre ministro, se aceitar o convite de Vigilante ou de Wellington Luiz, certamente vai se deparar com a XXXII RA do DF, Sol Nascente e Pôr do Sol que, de acordo com o Censo 2022 do IBGE, somente a comunidade de Sol Nascente, alcançou o título de maior favela da América Latina, com 32.081 residências, após ultrapassar a favela da Rocinha com 30.955, situada, no Rio de Janeiro, em número de domicílios.

Tais dados, remetem a classe política, que a cada quatro anos passa a habitar o DF, a algumas considerações. Uma delas, a necessidade de conhecer de fato, e não se limitar a falar de uma “Brasília”, do ‘censo comum’. Mas de um distrito federal, pungente de quase 3 milhões de pessoas que acordam cedo, trabalham, estudam e lidam com os diversos problemas comuns às grandes metrópoles.

Isso, sob pena de ao tentar estereotipar Brasília ao tecer uma crítica vazia baseada ao ‘censo comum’ incorra na prática de muitos políticos, a exemplo de Kataguiri, ou de muitos prefeitos, que volta e meia protagonizam manchetes do Metrópoles, em ocasiões que fazem incursões ao DF, atrás de recursos aos municípios, mas que acabam reforçar uma prática condenável da busca por turismo sexual.

Ou, talvez mais grave que isso, de se atribuir a alcunha de sanguessugas, a cerca de 3 milhões de pessoas, apenas reforçam os mesmos estereótipos xenofóbicos, a exemplo de algumas ‘personalidades, em geral do Sul, Sudeste, em relação ao povo nordestino, Com ocorreu nessa semana, por parte do governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo/MG) ao sugerir que as pessoas da região nordeste e norte vivam apenas de assistência por parte do governo.

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