Publicada em 15/01/2023 às 14h30 – Atualizada em 16/01/2023 às 13h10

Por Kleber Karpov

Em 14 de janeiro de 2019, a repórter da Rádio Nacional, vinculada a Empresa Brasil de Comunicação (EBC), Kariane Costa da Silva Oliveira, realizava uma transmissão em frente ao Palácio do Planalto, para acompanhar a agenda do então presidente eleito, Jair Messias Bolsonaro. No anúncio da pauta do dia a jornalista, trouxe as ‘prioridades’ daquela gestão.

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Para a ocasião, o decreto que flexibilizou a posse de armas, o chamado ‘combate de fraudes’ no Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) – que na prática enrijeceu regras e retirou beneficiários, indevidamente, de pessoas assistidas pelo INSS –, além da reforma da previdência – que destruiu a vida de milhares de servidores públicos.

Com um sorriso estampado no rosto, de quem apenas apontava as prioridades de um novo governo, a Kariane Costa reportou pautas. Sem ter noção que estava, assim como toda sociedade brasileira, a entrar em um longo e tenebroso período de ações contra o povo, a democracia, contra os servidores públicos, em especial, os da EBC.

Às sombras da privatização

Em março de 2021, o governo anunciou a inclusão da EBC no Plano Nacional de Desestatização (PND), primeira etapa para o processo de privatização de empresas do governo. Par ao então ministro da Economia, Paulo Guedes, a Empresas Brasil de Comunicação, se resumia a conversão de redução do orçamento de 508,1 milhões (2019), para economia estimada em R$ 400 milhões, ao ser privatizada.

“[A inclusão] converge com o propósito de reordenar a posição estratégica do Estado na economia, contribuindo para a reestruturação econômica do setor público, permitindo que a administração pública concentre seus esforços nas atividades em que a presença do Estado seja fundamental”, informou o governo, conforme reportagem de Laís Lis do G1 em 16 de março de 2021.

Posição essa, prontamente confrontada por parte de funcionários da estatal por um servidor da EBC, não identificado pela reportagem. “A EBC não dá ‘prejuízo’ ou ‘déficit’. Ela é uma empresa pública dependente, e não autossuficiente como Correios ou Banco do Brasil. Embora ela consiga arrecadar recursos com patrocínios e prestação de serviços, suas fontes de financiamento não servem e nunca servirão para torná-la autônoma, já que ela não deve se tornar refém do próprio mercado para garantir ainda mais sua autonomia”, afirmou

Papel social e histórico

Guedes ignorou todo o histórico de quase um século de história, como bem lembrou a jornalista, Akemi Nitahara, durante live ‘A importância da EBC e da comunicação pública para a democracia, desde a fundação da Rádio Sociedade do Rio de Janeiro em 1923, atual Rádio MEC AM, lançada por Edgard Roquette-Pinto, – médico legista, professor, escritor, antropólogo, etnólogo e ensaísta brasileiro, considerado o pai da radiodifusão no Brasil –; a criação a Rádio Nacional ou ainda da Agência Brasil fundada pelo ex-presidente Getúlio Vargas em 1937; até a criação efetiva da EBC por força da Lei Lei nº 11.652, em dia 7 de abril de 2008.

Guedes ignorou também a importância do papel social da EBC que, com um efetivo de aproximadamente 1.800 funcionários era responsável por levar a comunicação pública a todos os rincões do país, seja por meio de rádio, tv, agência de notícias e de fotojornalismo.

Demanda essa realizada com sucesso e responsabilidade, ao se observar o fechamento, em 2021, de recorde de audiência e o recebimento de 19 prêmios jornalísticos e de gestão, com alcance de 230 milhões de usuários no Youtube vinculada aos veículos — TV Brasil, Rádios, TV Brasil Gov e Agência Brasil, ter obtido o 6o lugar no ranking, ao se manter no top 10 da TV brasileira, segundo dados do Painel Nacional de T V(PTN), o que representa um alcance de 3,5 milhões de lares nas localidades de São Paulo, Rio de Janeiro e Distrito Federal, conforme registro da EBC (23/12/21).

Perseguições

Mas não para por aí, se por um lado, a EBC passou por ser ignorada quanto ao contexto histórico e social, por outro, se tornou refém de censuras e perseguições. Em especial, com a chegada da pandemia do Coronavírus, ocasião em que se tornou patente a interferência de nomeados por Bolsonaro, no trabalho de editores, jornalistas repórteres de emissoras de rádio e TV, além da agência, nas coberturas, de fatos relevantes da política e da saúde pública brasileira.

No final de junho de 2021, surge a primeira denúncia, pública, contra diretores da EBC, nomeados por Bolsonaro por ameaças contra funcionários da estatal. Gestores ameaçaram os repórteres e dirigentes sindicais do DF Victor Ribeiro e Gésio Passos.

Ribeiro foi ameaçado a se tornar alvo de sindicância, em caso de se negar a assinar Termo de Justamente de Conduta (TAC), proposto pela diretoria de jornalismo, uma vez que se engou a gravar versão censurada de reportagem sobre a CPI da Pandemia. Passos por sua vez, foi ameaçado a ser transferido de local de trabalho, o que caracterizou assédio moral. Isso, além de sofrerem retaliações por parte dos superiores. Casos esses repudiados por parte da Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) e do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do DF (SJPDF).

KarianeFica!

No entanto, a perseguição mais patente, se deu, justamente contra Kariane Costa após gestores da EBC a acusarem de cometer crimes de injúria e difamação, por denunciar práticas de assédio moral dentro da estatal. Ocasião em que a Comissão de Sindicância da empresa recomendou a demissão, por justa causa, da servidora.

Concursada há 10 anos e lotada no departamento de radiojornalismo, Kariane Costa formalizou denúncia na Ouvidoria da EBC, ainda em 2021, por prática de assédio moral contra os servidores subordinados. Isso por representar, também, o Conselho de Administração da Empresa e, nessa condição, receber relatos de irregularidades internas, por parte de colegas. Por exemplo, de os chefes se referirem aos subordinados como “quadrilhas” e “terroristas”. Em setembro trabalhadores da EBC fizeram um ato em apoio a colega, nas sedes da empresa em Brasília, Rio de Janeiro e São Paulo.

Ato de servidores da EBC em São Paulo,  pela permanência de Kariane Kosta – Foto: Reprodução/Portal dos Jornalistas

O caso, também teve grande repercussão por parte de entidades de classe, e também de veículos que expressaram solidariedade à Kariane Costa. Além de contar com o olhar atento e a intervenção por parte do Senado Federal que pediu ao Ministério Público Federal (MPF) ao Ministério Público do Trabalho (MPT), além da Defensoria Pública da União (DPU) a apuração da perseguição de gestores aos servidores da EBC. “A perseguição àquela jornalista integra o quadro de assédio moral e perseguição política que tem sido contumaz na EBC”, sentenciou o senador Humberto Martins, presidente da Comissão de Direitos Humanos do Senado Federal, ao cobrar investigação do caso.

Mas, para quem acredita que os casos parem por aí, a quantidade de denúncias, por parte dos trabalhadores da EBC demonstram uma prática sistemática por parte dos gestores da estatal. Isso é o que mostra a 4ª edição do Dossiê Censura e Governismo na EBC, com dados compilados entre agosto de 2021 e julho de 2022 ao apontar um total de 64 casos de censura. Dessas, 15, equivalente a 23% relacionadas a questões de direitos humanos, 12 a Saúde (18,75%), 10 a política (15,6%) e 27 a outros temas. Isso, com a ressalva que se tratam apenas de casos relatados por parte dos servidores, portanto, sem refletir a totalidade dos atos praticados.

Fonte: Fenaj

Os números trazem outros dados também relevantes, a exemplo do aparelhamento e da má utilização na produção de pautas por parte empresa de comunicação pública, sob gestão do governo Bolsonaro. Ao todo, o dossiê aponta 228 casos de governismo – pautas pró-governo, sem finalidade ou justificativa específicas –, e ainda um total de 245 pautas de produções jornalísticas totalmente irrelevantes à sociedade.

Retomada

Com a posse do presidente Lula e a revisão, em conjunto com o Ministro-Chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, Paulo Pimenta, de intenções, a EBC, é retirada finalmente, há exatos quatro anos depois (14/Jan), das sombras da privatização e poderá retomar o importante papel da comunicação pública voltada a atender os interesses da população brasileira. Boa nova essa, publicada por Pimenta, no microblog Twitter.

E, para um governo que se inicia com a responsabilidade de deixar claro a retomada da Democracia no país, que ainda na composição da equipe de transição, Lula deixou claro tal compromisso, e ainda voltou a agregar os princípios de inclusão, de amparo aos trabalhadores e da justiça social.

Isso foi o que pimenta deixou claro ao anunciar a edição extra do Diário Oficial da União (DOU) com mudanças na gestão da EBC “que resultará no fortalecimento da comunicação pública, na valorização dos empregados e no aprimoramento da governança”, concluiu.

Sob essa ótica, a nomeação de Kariane Costa, por parte do ministro das comunicações, foi para alguns profissionais de imprensa, considerado uma justa homenagem. Porém, vai muito mais além, os 10 anos de ótima avaliação da repórter, que profissionalmente anunciou com sorriso, no início da gestão de Bolsonaro, pautas que se mostraram duras a camada social menos favorecida da população brasileira, simbolicamente, também deixa claro a intenção de mostrar o acolhimento aos oprimidos, em especial, aos servidores públicos.

Perfil

Graduada em Jornalismo, Kariane Costa, 41 anos, quase metade do tem a atuar no segmento. Servidora concursada da EBC, desde 2012, além de atuar na Ouvidoria, foi repórter do radiojornalismo com atuação setorista do Palácio do Planalto e do Congresso Nacional. Em 2018, foi finalista do prêmio Vladmir Herzog com a reportagem O Povo Venezuelano e a Crise.

Ainda na EBC, atuou na colaboração em produção de matérias em espanhol para a Radioagência Nacional e ainda com entradas sobre as conjunturas política e econômica do Brasil, na Rádio Nacional da Argentina. Kariane Costa também foi correspondente e comentarista política na rádio Blu-Rádio; trabalhou no Centro de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico da Universidade de Brasília (UnB). 

Kariane Costa foi também integrante da Comissão de Empregados da EBC, em 2016 e representante no Conselho de Administração desde 2021.



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