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05 dez 2025 02:48

Covid-19 deixou 149 mil crianças e adolescentes órfãos em 2020 e 2021

Se considerados avós e outros cuidadores, número sobe para 280 mil

Por Kleber Karpov

Um estudo conduzido por pesquisadores brasileiros, americanos e ingleses revelou que a pandemia de Covid-19 resultou na orfandade de 149 mil crianças e adolescentes no Brasil, entre 2020 e 2021 (26/Out). O levantamento, que utilizou modelos estatísticos baseados em dados de excesso de mortalidade e registros demográficos, demonstrou que o número de menores que perderam os pais ou cuidadores principais nas suas residências alcançou 284 mil, expondo grandes desigualdades regionais e a urgência por políticas públicas específicas no país.

O Legado da Orfandade

O número de vítimas indiretas da Covid-19 no Brasil totaliza 284 mil, incluindo crianças e adolescentes que perderam pais, avós ou outros familiares mais velhos que exerciam um papel de cuidado essencial. As estimativas referem-se estritamente aos anos de 2020 e de 2021, considerados os períodos mais severos da emergência sanitária no território nacional.

O grupo de pesquisadores, composto por especialistas de instituições do Brasil, dos Estados Unidos e da Inglaterra, lançou o estudo com o objetivo de demonstrar a “magnitude da orfandade no Brasil”. O trabalho também visa mapear as “grandes desigualdades entre os estados”, conforme destacam os seus autores.

A professora Lorena Barberia, que atua no Departamento de Ciência Política da Universidade de São Paulo (USP) e é uma das autoras do trabalho, salienta que os impactos de uma emergência sanitária são primeiramente identificados entre as vítimas diretas, mas há sempre aqueles que são afetados secundariamente pelas mortes.

Ela explicou a metodologia de inclusão de outros familiares cuidadores. “Nós quisemos olhar a vulnerabilidade das pessoas que dependem de quem faleceu. Achamos super importante lembrar que as pessoas acima de 60 anos não só tinham mais chance de morrer, mas, muitas vezes, tinham um papel na estrutura familiar muito decisivo. Muitas crianças e adolescentes dependiam dessas pessoas. Então, pensamos que tínhamos que considerar essas estimativas, tanto de pais e mães como desses responsáveis”, afirmou a professora.

Os modelos estatísticos utilizados no levantamento foram alimentados por dados demográficos como a taxa de natalidade e o excesso de mortalidade durante os anos de 2020 e 2021, permitindo chegar a projeções detalhadas sobre o cenário nacional da orfandade.

Os dados mostram que cerca de 1,3 milhão de crianças ou adolescentes, na faixa etária de zero a 17 anos, perderam um ou ambos os pais, ou algum cuidador com quem viviam, por razões diversas. Deste total, 284 mil se tornaram órfãos ou perderam este cuidador em virtude da Covid-19, exclusivamente.

Ainda no recorte relativo às mortes pela doença, 149 mil crianças e adolescentes ficaram órfãos de pai e/ou mãe. Destes, 70,5% perderam o pai, enquanto 29,4% perderam a mãe. O estudo registrou ainda que cento e sessenta crianças e adolescentes foram vítimas de orfandade dupla, perdendo ambos os genitores.

Ao se analisar o panorama estadual, verificou-se que 2,8 crianças ou adolescentes a cada mil perderam um ou ambos os pais, ou algum familiar cuidador devido à Covid-19. As maiores taxas de orfandade foram observadas no Mato Grosso (4,4), em Rondônia (4,3) e no Mato Grosso do Sul (3,8). Em contraste, as menores taxas ficaram com o Rio Grande do Norte (2,0), Santa Catarina (1,6) e o Pará (1,4).

Impactos nos Direitos e Vulnerabilidade Social

Os números mapeados na pesquisa representam crianças e adolescentes reais, conforme relatou Ana Lúcia Lopes. Ela perdeu o companheiro, o fotógrafo Cláudio da Silva, em 2021, o que fez seu filho, Bento, ficar órfão de pai aos quatro anos de idade. Ele tinha 45 anos, não possuía fator de risco, e faleceu após ser internado com sintomas respiratórios durante uma viagem a trabalho, sem poder rever o filho.

Ana Lúcia Lopes detalhou a experiência de luto e a busca por amparo para o filho. “Apesar de tudo, no começo, ele parecia bem. Um tempo depois, quando ele foi mudar de classe na escola, ele começou a chorar bastante, porque não queria perder a professora. Aí, eu perguntei o que ele estava sentindo, e ele disse: ‘Ah, mãe, acho que eu queria o meu pai’”, disse Ana Lúcia Lopes, mencionando que o filho iniciou o atendimento psicológico a partir deste momento.

Conforme a promotora de justiça Andréa Santos Souza, que atua na área da Infância e Juventude em Campinas (SP) e é coautora do estudo, a perda financeira configura um dos problemas mais frequentes enfrentados pelas famílias em situações de orfandade. No caso de Bento, o pai recolhia a contribuição previdenciária referente ao seu trabalho como microempreendedor individual, o que assegurou a pensão por morte e evitou problemas financeiros imediatos para a família.

A promotora Andréa Santos Souza, durante a pandemia, focava o seu trabalho na proteção de crianças e adolescentes afetados pelo fechamento das escolas e pelo aumento da miséria e da violência familiar. Percebeu, contudo, um aumento nos pedidos de guarda por parte de tios, avós e outros parentes.

Este cenário evidenciou que “essas crianças estavam ficando órfãs sem uma representação legal”, relatou Andréa Santos Souza. Ela solicitou aos cartórios todas as certidões de óbito de pessoas que faleceram por Covid-19 e deixaram herdeiros menores de idade. A ação resultou na localização de quase quinhentas crianças órfãs em uma primeira análise, em um trabalho que envolveu a triagem de mais de três mil certidões de óbito.

Era crucial checar a ocorrência de outras violações de direitos, além da perda de mães e pais. “A primeira delas é a separação de irmãos, né? As famílias numerosas separam os irmãos. Quanto aos bebezinhos muito pequenos, tem o problema de adoções ilegais. As meninas tinham situações de exploração de todas as formas, trabalho doméstico forçado, casamento infantil, abuso sexual… Em muitos meninos, a gente via o direcionamento para o tráfico ilícito de entorpecente ou exploração do trabalho infantil…”, enumerou a promotora, detalhando as vulnerabilidades.

A maioria dos órfãos é composta por filhos de trabalhadores de setores essenciais, como limpeza, alimentação, transporte ou informais, que não puderam isolar-se em casa. Este dado reforça como a pandemia escancarou as desigualdades sociais, apesar de também ter atingido filhos de profissionais de saúde que faleceram.

A dimensão da tragédia levou a promotora Andréa Santos Souza a entrar em contato com os pesquisadores do Imperial College, de Londres, em julho de 2021, após o lançamento das primeiras estimativas globais. A partir desta colaboração, o resultado dos modelos estatísticos pôde ser comparado com os dados reais da promotoria.

Ainda no processo de cruzamento de dados, os pesquisadores conheceram uma ferramenta do Registro Civil brasileiro, na qual as certidões de nascimento são emitidas em conjunto com o CPF dos pais. A Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen/Brasil) confirmou que, de março de 2020 a setembro de 2021, 12,2 mil crianças de até seis anos ficaram órfãs em decorrência da Covid-19, o que serviu para reforçar a validade das estimativas do estudo mais abrangente.

“O objetivo é lembrar que, mesmo depois do fim da pandemia, nós precisamos de políticas públicas para dirimir as desigualdades provocadas pela pandemia, porque nós sabemos que algumas pessoas saíram em uma situação muito mais vulnerável que outras. Não houve um programa desenhado para essas crianças especificamente, e a sociedade não estava acostumada a essa magnitude de órfãos. Os programas que existem claramente precisam ser fortalecidos, porque temos um grupo novo de crianças e adolescentes, que não era esperado”, concluiu Barberia.




Kleber Karpov, Fenaj: 10379-DF – IFJ: BR17894 Mestrando em Comunicação Política (Universidade Católica Portuguesa/Lisboa, Portugal); Pós-Graduando em MBA Executivo em Neuromarketing (Unyleya); Pós-Graduado em Auditoria e Gestão de Serviços de Saúde (Unicesp); Extensão em Ciências Políticas por Veduca/ Universidade de São Paulo (USP);Ex-secretário Municipal de Comunicação de Santo Antônio do Descoberto(GO); Foi assessor de imprensa no Senado Federal, Câmara Federal e na Câmara Legislativa do Distrito Federal.

 

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