Nesta quinta-feira (5), em audiência pública com mais de seis horas de duração, a Secretaria de Saúde do Distrito Federal apresentou sua prestação de contas aos deputados da Comissão de Saúde (CSA) da Câmara Legislativa. Na ocasião, foram apresentados painéis com dados técnicos relativos ao terceiro quadrimestre de 2024 na presença de parlamentares, técnicos do governo, representantes do Ministério Público e da sociedade civil.
Segundo os dados apresentados pelo governo sobre o desempenho da pasta no terceiro quadrimestre do ano passado, a Secretaria de Saúde teve uma dotação orçamentária inicial de R$ 11,04 bilhões, mas acabou terminando o quadrimestre com uma dotação autorizada de R$ 13,3 bilhões. A diferença se deu por conta da incorporação de créditos adicionais ao orçamento, além do superávit de receitas.
Em relação às despesas da Secretaria de Saúde, o terceiro quadrimestre fechou com uma despesa empenhada de R$ 12,95 bilhões, sendo que a despesa liquidada ficou em R$ 12,32 bilhões. A diferença está nos restos a pagar levados para o ano orçamentário subsequente. Sobre a composição das fontes de recurso da Secretaria de Saúde, 60,5% do total é proveniente dos recursos do Fundo Constitucional do Distrito Federal. Os recursos provenientes dos cofres do Governo do Distrito Federal representam 28,2% do total das fontes de recurso. O valor repassado pelo Ministério da Saúde representa 9,2% do total e as emendas parlamentares e convênios somam 2% da receita da secretaria. A execução dos recursos enviados por deputados distritais por meio de emendas ao orçamento ficou em 70,77% no último quadrimestre de 2024.
No detalhamento da natureza das despesas da Secretaria de Saúde é possível verificar que os gastos com pessoal e encargos sociais representam 62,2% de todos os gastos da pasta. As despesas correntes com custeio figuram em 36,1% dos gastos. Já o percentual destinado para investimento em obras e aquisição de equipamentos somou apenas 1,7%. Apesar de representar o maior percentual de gastos da pasta, o custo com pagamento de pessoal e encargos sociais é financiado em 77% pelo Fundo Constitucional do Distrito Federal.
Atenção primária
Um dado que chamou a atenção dos parlamentares foi o percentual de execução de recursos na atenção primária das Unidades Básicas de Saúde (UBS), que ficou em apenas 67% de um total empenhado de 90%. Para o deputado Jorge Vianna (PSD), o problema está na falta de dinheiro. “É a clássica política do cobertor curto. Os recursos vão para assistência hospitalar e assistência farmacêutica. Estão escolhendo quem vão salvar. Nos outros estados os gastos são divididos com as prefeituras. Não justifica alguém dizer que somos marajás do serviço público, o problema é que aqui não tem prefeitura para ajudar nos gastos. Por isso é óbvio que aqui o gasto vai ser maior. Gestão tem, o que falta é dinheiro. Se os investimentos em atenção primária estão baixos é porque falta dinheiro. Precisamos dizer para a sociedade que os servidores estão se sacrificando para tocar uma gestão sem dinheiro”, avaliou Jorge Vianna.

A deputada Dayse Amarilio (PSB) discordou do colega. “Nós não temos a contrapartida municipal, mas nós temos uma arrecadação federal que compensa isso. O DF conta com o Fundo Constitucional, que os outros estados não têm. Tivemos aumento de 12% na arrecadação no primeiro semestre deste ano. Houve investimento em outras áreas e não na saúde. Houve aprovação de projetos de renúncia de recursos que poderiam ter ido para a saúde”, argumentou a deputada.
Para a promotora de justiça Hiza Carpina, a baixa execução orçamentária na atenção primária é um alerta. “No entender do Ministério Público, é indispensável o investimento em atenção primária. A execução orçamentária da atenção primária não pode ficar para o final do ano. A execução tem que ser feita com planejamento. Não pode executar de qualquer jeito somente para não perder o recurso. A vigilância em saúde no DF vem sendo subfinanciada e pouco capacitada. Se não investirmos em vigilância em saúde, como vamos tratar os riscos epidemiológicos no DF? Houve baixo investimento e baixa execução nesta área.
O percentual orçamentário de investimento gira em torno de 1,7%, o que é baixíssimo. Não conseguimos ver investimento nos vetores de mudança. Investimento é uma decisão política”, frisou.

O secretário de saúde, Juracy Cavalcante Lacerda Júnior, pontuou que a pasta tem muitos gastos com a gestão de leitos de UTI na política de complementaridade, quando a secretaria paga pela utilização de leitos de hospitais privados. “Precisamos de uma mudança cultural. A partir do momento em que não giramos bem os leitos, temos que usar a rede privada para absorver um paciente que está precisando. Quanto mais formos eficientes, mais sobra recurso para ser direcionado a outros investimentos. A cada 100 reais investidos em saúde, temos 53 reais de prejuízo, basicamente por causa do giro de leitos. Se a gente considerar um hospital de 400 leitos com taxa de ocupação de 85%, se for possível reduzir um dia no tempo médio de internação, surgem mais 65 leitos. Estamos trabalhando para isso”, garantiu.
Judicialização
O secretário também reclamou do alto número de processos na justiça contra a Secretaria de Saúde. “Hoje na secretaria existem inúmeros casos de judicialização. Isso acaba sequestrando verba pública porque temos que cumprir as ordens judiciais”, afirmou. A reclamação do secretário, no entanto, foi rebatida pela promotora Hiza Carpina. “Entendo que a judicialização não é causa, mas sintoma. Se há judicialização em massa, significa que está muito ruim a política pública. No ano passado foram mais de 34 mil ações individuais. Hoje o Ministério Público tem procurado não judicializar as questões para manter diálogo com a Secretaria de Saúde. Se fôssemos judicializar todos os casos, teríamos uma intervenção judicial na saúde do DF. Até mesmo consulta médica está sendo judicializada”, apontou a promotora.
Servidores da Saúde
Também foram apresentados dados relativos ao quadro de pessoal da secretaria. Atualmente, a pasta conta com 31.992 servidores. Desse total, 29% são técnicos de enfermagem, 19% são servidores da assistência pública à saúde, 16% são médicos, 13% são enfermeiros, 11% são especialistas em saúde, 6% são agentes de vigilância ambiental e agentes comunitários de saúde, 2% são cirurgiões-dentistas e 1% são gestores. Ainda segundo os dados apresentados pela secretaria, foram nomeados 914 novos servidores no terceiro quadrimestre de 2024.
A deputada Dayse Amarilio apontou queda no número total de servidores e chamou a atenção para o problema do absenteísmo, que é o termo utilizado para designar a falta recorrente de um funcionário no cumprimento da jornada de trabalho. “Observo uma queda de 3,99% no número de servidores e um aumento de 233% no número de contratos temporários. Além disso, os planos de carreira estão defasados. As leis que estabelecem os planos são de 2014. A secretaria registrou uma carência de 25.490 horas semanais de enfermeiros, o que corresponde a 1275 servidores enfermeiros com carga horária de 20 horas. Também foi registrada uma carência de 137.500 horas semanais de técnico de enfermagem, o que corresponde a 6876 servidores técnicos de enfermagem com carga horária de 20 horas. A causa do absenteísmo é o número de servidores sobrecarregados. Um enfermeiro sozinho no pronto-socorro acaba adoecendo. Podemos assegurar que o absenteísmo é um sintoma de algo errado na gestão”, afirmou.