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23 abr 2024 09:01


Em tempos de MP 759… Rollemberg regulariza de um lado e invade, comunidade carente, do outro?

GDF pretende construir núcleo de detenção de crianças e adolescentes femininas, há 20 metros de templo religioso e dentro de comunidade estabelecida por quase 40 anos no Alagado da Suzana, no Gama

Por Kleber Karpov

Em fevereiro A Comissão de Licitação da Subsecretaria de Administração Geral (SUAG) da Secretaria de Estado de Políticas para Crianças, Adolescentes e Juventude (SECRIANÇA), anunciou a abertura de licitação para construção da Unidade de Internação Feminina do Gama.

O que o GDF não falou foi onde faria a construção da unidade. A área escolhida para fazer a unidade não ficasse a 20 metros do tempo Seara Espiritual A caminho da Luz e em área ocupada, em alguns casos há quase 40 anos, pela comunidade Alagados da Suzana onde mora cerca de 150 pessoas, socialmente, necessitadas, de amparo do Estado.

Locações da comunidade Alagado Suzana, do templo e do presídio feminino Colmeia – Fonte: Google Maps

 

Locações do templo da comunidade Alagado da Suzana e projeção do GDF para construção do presídio feminino Colmeia – Fonte: GDF

O GDF aponta a realização da Concorrência 01/2017, que teve como vencedora, a empresa Combrasen Companhia Brasileira de Soluções em Engenharia Ltda. Embora o blog tenha conseguido obter cópia do Edital da Concorrência n.o 001/2016-SECRIANÇA/Processo n.o 417.000.056/2016, no site Compras Net, do GDF, a referida licitação, inexiste.

O valor do contrato da Obra superou os R$ 13 milhões, desses, R$ 5,25 milhões foram empenhados por meio da Nota de Empenho 2017NE01166, em 26 de abril.

Para quantos?

Mas, um dado que chama atenção é a quantidade de crianças e adolescentes a serem beneficiadas. À época da divulgação do edital de licitação, o GDF divulgou matéria em que anunciou que uma unidade, ora existente, na Região Administrativa de Santa Maria, 899 meninos no sistema sócio educativo do DF e, 18 meninas, “todas elas ficam em um módulo separado na unidade de Santa Maria”, e que outras “estruturas que recebem jovens infratores são as de Brazlândia, de Planaltina, do Recanto das Emas e de São Sebastião.”,

Ao apurar junto ao GDF a questão da ocupação de área na comunidade Alagado da Suzana, a SECRIANÇA informou ao Política Distrital (PD), por meio da Assessoria de Comunicação (ASCOM) que a unidade abriga, atualmente, apenas, 31 meninas.

“Hoje, as adolescentes que estão em medida socioeducativa de internação ficam em módulo exclusivo na Unidade de Internação de Santa Maria. O DF tem, atualmente, 31 meninas em sistema de internação, sendo 14 em regime provisório – máximo de 40 dias – e 4 em sanção – máximo de 90 dias.”.

Obrigatoriedade, economia…

Um questionamento pertinente é o gasto de R$ 13 milhões, para um governo que aponta falta de recursos, diariamente. Isso para garantir a detenção, de 31 meninas, ora acolhidas em outra unidade de detenção.

A SECRIANÇA observa que os recursos são destinados pelo governo federal e atende a uma determinação legal de manter área de detenção específico para as meninas. “de convênio específico para este fim com a Secretara Nacional de Direitos Humanos (SDH), cumprindo a Lei do Sinase [Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE), Lei 12.594 de janeiro de 2012]”. Isso “próximo ao Presídio Feminino do DF, conhecido como Colméia.”. Porém, uma advogada, que conversou com PD, sobre o assunto, questionou a ação da SECRIANÇA.

“Nesse caso, em vez de gastar mais de R$ 13 milhões para construir uma nova unidade, não seria mais econômico e logisticamente, pertinente construir a unidade como um anexo do próprio presídio feminino, situado há menos de um quilômetro da área e que se pretende construir da unidade de detenção feminina para crianças e adolescentes, respeitando as devidas determinações legais em relação às normas estabelecidas para construção?”, perguntou a operadora de direito que pediu sigilo de identidade.

GDF empenhou R$ 5,25 milhões para construção de unidade de detenção para atender cerca de 30 crianças e adolescentes femininas. Valor é parte do custo total da obra de mais de R$ 13 milhões. – Fonte: Porta da Transparência/GDF

Propriedade
Estranhamente, na resposta encaminhada ao PD, a SECRIANCA afirma ser proprietária da área, o que também chama atenção, uma vez que o blog acompanha, há mais de um ano, outra demanda, naquela comunidade, em que a área foi cedida em 1977, pela então Companhia Imobiliária de Brasília, atualmente Agência de Desenvolvimento do Distrito Federal (TERRACAP) à uma entidade religiosa, com atuação no desenvolvimento social que sempre realizou projetos sociais àquela comunidade.

Reconhecimento do Estado

A gestão do atual governador do DF, o socialista, Rodrigo Rollemberg (PSB), após realizar diversos atos questionáveis, por meio de truculência e arbitrariedades em desocupações de áreas ocupadas em várias regiões do DF, por parte da Agência de Fiscalização do DF (AGEFIS) começa a mudar o discurso e tenta se antecipar aos efeitos da Medida Provisória MP 759, em tramitação no Congresso Nacional.

Nesse contexto, Rollemberg fez, recentemente, discurso que pretende regularizar a venda de lotes em áreas condominiais. Porém, em relação à comunidade do Alagado da Suzana, aparentemente, o governador deve dar continuidade à omissão para com as 150 moradores daquela região.

Ao menos é a impressão dada pelo governador, após terem recebido o comunicado que na próxima segunda-feira (8/Mai), máquinas e operários devem começar a construir a unidade de detenção de crianças e adolescentes, dentro da área em que residem.

A comunidade que agradece o apoio recebido de parlamentares e por parte do Executivo, até o fim da gestão do ex-governador, Agnelo Queiroz (PT) agora demonstra o descaso da gestão de Rollemberg, para com a comunidade.

Dona Maria do Socorro (direita) moradora de Alagado da Suzana há 26 anos. – Foto: Divulgação/Arquivo pessoal

Esse é o caso de dona Maria do Socorro Nunes, dona de casa, que completou 64 anos de idade na última semana, residente há quase três décadas no Alagado da Suzana. “Moro aqui há 26 anos, meus filhos, meu neto, todos nasceram aqui e tudo sempre foi uma labuta.”, disse ao lembrar que a distrital, Celina Leão, foi responsável por ajudar a garantir a instalação de energia elétrica no local “Nós tem luz aqui hoje, por causa daquela deputada, a Celina Leão”, lembrou.

Dona Flávia, com 63 anos, residente há 33 anos na comunidade também seguiu o mesmo caminho. “Eu, meus filhos e meus netos, eu tenho 15 netos sabe? Tudo criado aqui. Quando era o outro governador, o governador Agnelo, meus meninos [adolescentes] estudaram tudo aqui – disse ao se referir à escola onde funcionou, por quatro anos, o projeto Educação de Jovens e Adultos (EJA) –, depois que mudou eles tiraram tudo, a escola fica aqui. Um tempo desses eles tiraram o ônibus dos meninos [netos] pra ir pra escola. Se não fosse a Luciana nos ajudando e vocês, não sei o que seria de nós.”, concluiu.

A pessoa a quem dona Flávia se refere é a pedagoga, Luciana Cristina Guimarães de Lima, diretora da Fundação Seara Espiritual A Caminho da Luz, que coordena o templo e os projetos sociais no Alagado da Suzana. Luciana contou ao PD que há moradores com mais tempo na comunidade. “O senhor Geraldo é o morador mais antigo, está lá desde 1977. O senhor Valdecyr era uma das crianças de abrigo que foram enviados para lá, pelo juizado de menores, em 79.”, disse ao reforçar o reconhecimento do próprio Estado em relação a importância da comunidade.

Trabalho social

Crianças de Alagado Suzana participam do projeto Capoeira Transformando Vidas – Foto: Divulgação

Segundo Luciana, além de atividades religiosas, a comunidade local, principalmente as crianças, são, constantemente, “contempladas e envolvidas” em projetos sociais.

“Temos o projeto Capoeira Transformando Vidas, temos parceria com a ONG [Organização Não Governamental] Evolução, com o Instituto Federal de Brasília que é contrato formal]. As crianças participam de produção de brinquedos pedagógicos, de  Origami, de conceitos de desenvolvimento sustentável, entre outras atividades.”, explicou.

O servidor público federal, Joaquim Rodrigues de Sousa, presidente da Fundação,  lembrou ainda que as crianças contam ainda com vários parceiros que fornecem alimentos, lanches, doam brinquedos durante as atividades no Alagado da Suzana.

“Nós temos a Pamonharia Caipira e o  Kaká Hamburgueria que são do Gama, que sempre que fazemos alguma atividade, colaboram com doação de lanches, de cachorro quente, temos parceiros que já distribuíram bicicletas aos alunos que passaram de ano, além da participação ativa de pessoas em todo o DF.”, afirmou.

Mas o voluntariado vai além, de acordo com Luciana, entusiasmada ao buscar na memória as ações junto à comunidade.

“Aqui muita gente tem colaborado com a alegria e com o crescimento dessa comunidade. Sobretudo em datas especiais que colaboram com a passagem de Papai Noel, do Coelhinho da Páscoa, e tantos outros personagens lúdicos que permeiam o imaginário e propicia o crescimento intelectual, sobretudo das nossas crianças, nessa área tão carente de dignidade.”, afirma Luciana.

Luciana (em pé) conversa com advogados e moradores de Alagado da Suzana, sobre construção de unidade de detenção de crianças e adolescentes feminina. Foto: Kleber Karpov

Luciana, que se diz incansável quando o assunto é recorrer a colaboradores “advogados, professores e as entidades que nos ajudam, mas a divisão da vida familiar com a comunidade vai além.”. Segundo a coordenadora da Fundação, virou rotina ter que recorrer, também, à administração do Gama, de Santa Maria, órgãos do GDF, ao Ministério Público do DF e Territórios, Câmara Legislativa do DF (CLDF), Camara Federal e Senado Federal.

“Somos constantemente assediados, ou ameaçados de alguma forma. Quando não são os grileiros é o próprio Estado que nos deixa na mão. Temos a questão da escola, recente pois suspendera o transporte escolar e conseguimos retornar após abordar o governador participando de um programa em uma rádio. Agora temos um centro de detenção querendo se instalar aqui. Tudo bem que, já estamos perto da Colméia, mas nesse percurso, as crianças, principalmente elas, não têm acesso, mesmo visual, ao presídio. Isso já nos atrapalha um pouco pois algumas pessoas têm receio de vir para o nosso templo ou visitar a comunidade, por puro medo  da proximidade com o presídio da Colméia. Agora, um centro de detenção que vai ficar a 20 metros do nosso templo? Como vamos explicar às nossas crianças, que tanto lutamos para mostrar que é possível se ter uma vida digna, com o governo colocando um centro de detenção de crianças e adolescentes aqui, a 20 metros do nosso templo? É difícil de acreditar que o governo realmente não tem outro local, ou vai fazer isso conosco e nós se quiser que aceitemos calados.”, questionou Luciana.

Reação

Ao tomar conhecimento da construção de uma unidade de detenção para crianças e adolescentes, dentro da comunidade Alagado da Suzana, o senador Hélio José (PMDB-DF), recorreu à MP 759 e criticou a ação de Rollemberg. “O senhor governador, Rodrigo Rollemberg tenta fazer uma espécie de antecipação na questão da regularização fundiária para tentar colher os ‘louros’ políticos da iniciativa de parlamentares no Congresso Nacional”.

Hélio José se referiu a proposição do “Pacto por Brasília”, proposto pelo parlamentar, desde setembro de 2016, durante audiência pública realizada na Câmara Legislativa do DF (Set/2016), além das ações posteriores que culminaram em uma grande audiência pública no Senado Federal (Dez/16), com ampla participação do poder público, órgão de controle, Judiciário e da comunidade de áreas atingidas pela questão da regularização fundiária; denúncias das arbitrariedades praticadas pela gestão Rollemberg, em organismo internacional, no Parlamento Latino Americano (PARLATINO) e intervenção junto ao presidente Michel Temer que editou a MP 756 para tratar do tema em todo país.

A colocação de Hélio José foi para contrapor ao que chamou de “desorganização” por parte da equipe de governo do socialista, Rodrigo Rollemberg.

 “Eles vão na contramão do próprio discurso de regularização. Ele [Rollemberg] propõe fazer a regularização dos condomínios, o que eu acho louvável pois, finalmente o governador tomar essa iniciativa, mas parece ignorar uma comunidade carente, de mais de 150 pessoas carentes, que dependem, socialmente da ação e presença do Estado, do governo. E o que é mais grave, o senhor Rollemberg dá a entender que vai jogar por terra o trabalho da entidade, coordenada pela professora Luciana, que foi homenageada, na sexta-feira em sessão solene que fiz para homenagear todos os líderes comunitários. Ela que é uma grande liderança, que vem fazendo um trabalho lindo junto aquela comunidade do Alagado da Suzana e de outras cidades no DF e no Entorno. Não podemos aceitar que esse governo, além de não dar assistência do Estado àquela comunidade, vá atrapalhar o trabalho tão importante como o da Fundação dirigido pela Luciana. Meu gabinete vai requerer informações e vamos tentar sensibilizar o governo a rever essa construção lá naquela comunidade.”, disse Hélio José.

PD também conversou também com a deputada distrital, Celina Leão (PPS), que ao tomar conhecimento do que chamou de “invasão” de Rollemberg na comunidade Alagado da Suzana, afirmou que deve pedir ao GDF, na segunda-feira (8/Mai), que mude a construção de lugar. “O meu gabinete está acompanhando e na segunda-feira eu vou requerer informações ao GDF e vamos tentar mudar o local. A comunidade de Alagado Suzana contar conosco.”, disse Celina Leão.

O blog entrou contato com a administradora da RA Gama, Maria Antônia Rodrigues Magalhães, mas até o momento da publicação da matéria, PD não obteve retorno.

Linha do tempo

O Blog deu um giro na linha de tempo de Alagado da Suzana, nas redes sociais, para ter uma noção do trabalho que Rollemberg pode começar a jogar por terra. Além de uma página no Facebook, com um acervo de vários anos de realizações de projetos sociais, PD encontrou ainda sites e até canais no Youtube, publicados em 2010 e 2011, que demonstram, atividades há quase uma década documentadas e disponibilizadas pelo mundo.

Imagem: Reprodução Facebook

Vídeos

Opinião

O contrassenso da ação de Rollemberg é que a Secretaria da Criança está prestes a comprometer a qualidade de mais de 150 pessoas, dessas, mais de 50 crianças, para gastar R$ 13 milhões para  ‘enjaular’ pouco mais de 30 meninas, pelo sistema sócio educativos.

Talvez, melhor fosse se, SECRIANÇA repensasse o modelo de ressocialização, talvez a Fundação Seara Espiritual A Caminho da Luz, pudesse ser convidada a mostrar caminhos possíveis de se mostrar e demonstrar às crianças e adolescentes ‘enjauladas’, saídas para se construir um futuro digno.

Mas, na falta dessa capacidade, a crítica não se atém à ressocialização, mas a falta de senso por parte do GDF, do governador do DF, o socialista, Rodrigo Rollemberg e da própria SECRIANÇA, que certamente, poderiam alocar tal construção em outra localidade. Mesmo que fosse, como um anexo ao presídio Feminino, respeitando, claro, as determinações impostas pelas legislações.

Mais que isso, que Rollemberg e a SECRIANÇA respeitasse, senão à comunidade como um todo, ao menos as mais de cinquenta crianças do Alagado da Suzana.

Política Distrital apoia e se solidariza com a comunidade de Alagado da Suzana, além de recorrer às comissões de Direitos Humanos (CDH) das três casas legislativas no DF, da Superintendência do Patrimônio da União no DF (SPU-DF), Tribunal de Contas do DF (TCDF), MPDFT e Tribunal de Contas do DF (TCDF) e órgãos do Meio Ambiente, uma vez que recebeu denúncias que, aquela região do Alagado da Suzana, conservado pela comunidade local é o manancial, repleta de nascentes, que garantem o espetacular bioma na prainha, no extremo sul do Gama, do outro lado da cidade.

Será que a unidade de detenção feminina tem licença ambiental para construir na região?

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